sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Guerra do tráfico já fez mais de 100 vítimas assassinadas na cidade

Mais de 100 pessoas, a maioria jovens entre 17 e 25 anos, foram assassinadas nos últimos 30 anos na região central de São Sebastião. O levantamento foi feito por um morador que perdeu familiares e amigos.

Todas estas mortes estariam segundo ele, de alguma forma, vinculadas ao tráfico de drogas. Elas foram registradas nos bairros da Topolândia, Itatinga, Olaria, Varadouro, Rua Amazonas e Centro da cidade.
Este número cruel seria resultado da guerra dos traficantes de drogas. Ele traduz o medo da violência provocado na comunidade, medo este que aflorou no episódio da grafitagem no muro do Cnaga, e está por trás da polêmica criada em torno do assunto.

Esta história começou com um evento promovido pela Secretaria de Cultura de São Sebastião, que realizou no último dia 26 de julho uma manhã de grafitagem no muro.

Alguns grafites e desenhos, no entanto, foram considerados ofensivos por moradores. As reclamações chegaram até a vereadora Solange Ramos (PPS), que reclamou ao prefeito Ernane, que mandou repintar o muro apagando tudo.
Dois desenhos, principalmente, teriam provocado as reações: a frase “Estamos entrando na selva” – o muro fica na entrada dos bairros localizados no vale da Topolândia; e uma relação de nomes de pessoas assassinadas na região.

Assassinatos

“Eu escrevi ´em memória`, relacionei cerca 30 nomes, coloquei uma arma com o sinal de proibido, pintei três túmulos com cruzes, representando um cemitério, e coloquei uma gota de sangue na frente de cada nome”, conta Juliano Furtado, 35 anos, autor desta grafite.
Irmão de duas vítimas – um assassinado aos 33 anos, em 1979; e outro em 1999, aos 44 anos; e amigo de infância de várias outras pessoas mortas, Juliano nasceu e foi criado na Topolândia. E lá neste bairro ele mora até hoje, já casado e com dois filhos. Ele diz que sua intenção era homenagear as vítimas. Juliano sonha com o dia em que o bairro terá um memorial em homenagem a elas e como forma de consolar as famílias.

Servidor público concursado há 13 anos, ele conta que a vida no bairro era um inferno. “Não acontecia com a intensidade de hoje, mas estas mortes começaram há mais de 30 anos. Depois teve época que morria pelo menos uma pessoa por semana. Hoje a situação está muito melhor. Hoje o bairro é um paraíso comparado com o que já foi”, afirma ele.

Houve uma época em que até as aulas eram suspensas na escola local devido ao perigo dos tiroteios. Os bandidos avisavam que teria tiroteio e a escola suspendia as aulas. Foram dias de terror para a comunidade no auge da truculência dos traficantes, quando eram freqüentes as brigas entre as quadrilhas do tráfico de entorpecentes. As pessoas conviviam com os cadáveres que amanheciam nas ruas.

Os tiroteios constantes resultaram até em mortes por bala perdida – caso da jovem Josiane Pereira de Jesus, que hoje dá nome ao Centro de Saúde da Topolândia. Professora de dança, ela tinha apenas 21 anos, foi morta na rua, em frente à sua casa, com uma bala na nuca, em 29 de outubro de 2004. Dois anos depois a polícia esclareceu o crime, mas apenas um dos quatro acusados foi preso na época. Dos outros, a notícia que se tinha era que um já tinha morrido, também assassinado, e outros dois estavam foragidos.

“Eu fiz este levantamento do número de mortos conversando com as famílias das vítimas que eu conheço”, diz o rapaz. Ele conta que tentou conseguir o número oficial, mas não pode por causa da burocracia. “Cheguei a falar com alguns policiais, mas me disseram que o número oficial só seria fornecido se fosse solicitado por uma entidade e para fins de pesquisa e estudo”, afirma.

Segundo ele, entre os motivos que levaram todos aqueles jovens para o mundo das drogas estão a falta de estrutura no lar, o desemprego que desespera as pessoas, e a falta de perspectiva. “Cabeça vazia é oficina do diabo, já diz o ditado”, relembra, afirmando que a comunidade precisa de um atendimento maior para pessoas envolvidas com álcool e drogas; e que seus jovens precisam de muitas oficinas culturais e esportivas.

Polêmica

“A confusão foi criada pela vereadora Solange, que tem dois assessores disputando a eleição para a Sociedade Amigos do Bairro (Sab) do Topo”, acusa Juliano. “Ela está apadrinhando esta chapa e tentou me prejudicar citando meu nome na Câmara”. Ele encabeça uma das cinco chapas que disputam a eleição para a Sociedade Amigos da Topolândia, desativada há dois anos. A eleição acontece neste domingo, com direito até a comício.

“A vereadora levou o assunto para a sessão de Câmara, dizendo que tinha abaixo assinado dos moradores contra os grafites. Eu não soube de nenhum abaixo assinado. Entre as pessoas com as quais conversei não tinha ninguém se sentindo ofendido. Tenho uma vizinha que perdeu dois netos nesta guerra e ela até me agradeceu”, diz ele.
A vereadora Solange desmente. “Isto não tem nada a ver. Eu tenho mesmo um assessor, e o outro é só um amigo que me ajudou na campanha. Eles estão nas chapas, mas eu não me meto em eleição de Sab, só ajudo quem me pede. Eu nem conheço este rapaz, só mencionei o nome dele porque assinou o desenho”, diz ela, confirmando a existência do abaixo assinado. “Ele está lá no meu gabinete, à disposição”, diz.

Sobre o desfecho do caso – a pintura do muro apagando os grafites – Juliano considera que “deveria ter tido antes um debate e não simplesmente jogar fora o trabalho de tanta gente. É uma grande frustração agora ver aquele muro todo branco lá. Muita gente tinha se envolvido neste trabalho. Deveriam antes ter ouvido também o nosso lado”, desabafa.

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